sábado, 30 de janeiro de 2010

APENAS PALAVRAS!!!




"As melhores histórias jamais serão escritas, assim como os melhores momentos jamais retornarão, por isso quando se estiver feliz, tire o máximo de proveito dessa felicidade, pois o tempo arrastará tudo, e só ficarão as lembranças." (Bob Marley)


Juntar os pedaços e ver a beleza na multiplicidade dos remendos.

Olho através das janelas do tempo, e só consigo enxergar um amontoado de horas, recheadas de gestos sem sentido; escolhas que construíram um imenso abismo entre minhas mãos e meu coração, entre a música da Alma e o silêncio que me obriguei.

Olho para o que fui, e só consigo enxergar, o que não me permiti ser.

O extraordinário sempre me seduziu, mas abracei o ordinário, por comodismo, ou covardia; escolhi o Deus mais compreensivo e aceitei, sem contestar, a salvação como direito adquirido; acolhi as regras, vesti minha Alma e senti um pequeno alívio, quando me descobri “normal”; não deixei pegadas no mundo, pois sempre soube qual era o meu lugar e, nunca me permiti afastar dele; troquei os poemas pelas listas de supermercado, a gargalhada pelo sorriso contido, a embriaguez escandalizante, pela sobriedade melancólica e discreta.

Não me lembro em que momento, a coerência sufocou a ousadia; esqueci os motivos que fizeram com que o razoável tomasse o lugar do apaixonante; não sei o que me fez seguir os sussurros do comodismo, quando a felicidade gritava pelo meu nome.

Em algum momento, optei por ficar sentada na areia e não me permiti mais, a emoção do mergulho; troquei o beijo apaixonado, pela aliança planejada; em algum momento, permiti que o trabalho se transformasse em emprego, e o emprego em fardo, e o fardo, em infelicidade consentida.


Em algum momento, minha agenda ficou cheia e meu coração vazio; meu tempo ficou curto e minha vida pequena; meu preço ficou alto e meu valor medíocre; meus amigos ficaram convenientes e eu fiquei sozinha.

Olho para o espelho, e já não reconheço essa triste figura. Não sei onde me perdi; não sei quem eu perdi, quando permiti que escolhessem por mim. Nem sei se, algum dia, eu permiti alguma coisa; não me lembro de ter feito escolhas, as escolhas me fizeram e agora, não sei escolher.

Por mais que estenda minhas mãos, não consigo me alcançar; estou cada vez mais distante de mim, mas, não quero continuar me afastando. Preciso parar.

Parar para brincar com a criança que fui; parar para procurar no meu corpo, as marcas dos tombos, das histórias, das surras; parar para ouvir aquela música que embalou minha descoberta do amor; parar para rever as fotografias, o diário, o álbum de figurinhas; parar para redesenhar o mapa da minha vida e conhecer melhor os atalhos, as bifurcações, os desvios... e, quem sabe, redesenhar tudo isso com mais generosidade, mais amor, menos culpa, menos mágoas.


Sei que não posso reescrever o passado, mas só eu posso escrever um presente melhor; não posso apagar as pessoas que me magoaram, mas posso apagar as mágoas; não posso realizar os sonhos que abandonei, mas posso resgatar minha capacidade de sonhar; não posso desconstruir a infelicidade, mas posso construir uma nova felicidade; não posso desfazer as omissões ou as escolhas erradas que fiz, mas posso me perdoar e recomeçar uma nova história com mais respeito e atenção ao meu coração.


Estranha viagem é a vida, somos lançados no mar da existência, em um pequeno bote, que chamamos corpo; dirigidos por um silencioso e estranho capitão, que chamamos Alma, ou Coração. Ambos não se conhecem e, talvez, a única razão dessa estranha viagem, seja possibilitar a aproximação desses estranhos navegantes.

Nas noites de tempestade, o pequeno barco percebe, aterrorizado, a sua patética fragilidade; nesses momentos, transforma seu desespero em uma prece e tenta se agarrar a alguma verdade inventada, alguma certeza “absoluta”, algum Deus generoso para chamar de Pai.


Mas, a fúria do mar, revela a exata dimensão de tudo o que nos cerca, mostra que nossa ignorância não tem alcance, para certezas absolutas; nossas verdades não passam de possibilidades, que não possuem raízes no nosso coração e nosso Deus Pai continua tão silencioso, quanto no dia em que o primeiro homem lançou ao mundo, seu primeiro grito de horror em busca de um alento.

Onde estão as mãos que me colocaram nesta estranha viagem, sem guias, mapas, ou uma bússola que me aponte um norte qualquer.

Porque não consigo compreender a rota que esse capitão sussurra, e teimo em navegar por caminhos estranhos, que me afastam, cada vez mais, do meu porto seguro?

Sem certezas, ou verdades, apenas amparado pelo anseio, ou a suspeita de um Deus Pai, onde posso aportar meu abandono?


Onde encontrar motivos para não saltar no mar, e esquecer essa aventura louca, permitindo que o barco afunde, junto com meu desespero?

Invento regras, festas, ritos, histórias... para diminuir minha angústia e meu medo, mas, nas noites de tempestade, essas brincadeiras não conseguem distrair meu coração assustado.

Sei que não existe noite eterna, nem infinitas manhãs e, a tempestade às vezes cessa e o Sol aparece no horizonte.


E quando a noite cede lugar ao dia, meu coração parece acompanhar esse renascimento, eu descubro que também sei anoitecer e amanhecer, a escuridão e a luz também moram em mim.

Meu encantamento me faz acreditar que Deus deve ser Luz, calor, calmaria...

A viagem, já não me assusta tanto. Agora até posso ensaiar uma conversa, com meu capitão; posso tocar na água morna e sentir que isso é bom; consigo compreender que a fragilidade do barco, não parece tão assustadora, nas manhãs de calmaria; começo a perceber que a calmaria e a tempestade, independem da minha vontade, mas, o medo e a confiança, são construídos por mim.


A confiança não fortalece meu barco, nem acalma o mar; mas permite que o meu capitão continue no comando, e não mude a rota. O medo e a angústia, não tornam meu barco mais frágil, nem aumentam a fúria da tempestade, mas, arrancam do meu capitão, o poder de conduzir o barco para um porto seguro, meu medo nos deixa à deriva, à mercê do vento e de qualquer rochedo, que surgir no meio desse estranho mar.

Na tenho mapas, mas tenho estrelas; não tenho guias, mas tenho um capitão-coração que conhece a rota; não tenho verdades, mas tenho todas as perguntas que podem me apontar para algumas verdades confortáveis; não tenho certezas, mas suspeito que existe um porto seguro; não tenho um Deus Pai, mas sei que, a mão que me colocou nesta embarcação, continua empurrando esse sagrado barquinho.

Acho que estou, finalmente, aprendendo a navegar.

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